segunda-feira, maio 28, 2007

Palavras de criança!!!

Se todas as palavras já ditas até agora sobre nossa questão ambiental, e já faz tempo que estão sendo ditas, não foram suficientes para a conscientização pessoal de que cada um de nós deve cuidar seriamente e muito melhor do planeta onde vivemos, aí vai um pronuncimento de uma criança de 13 anos!!! Muito mais sensível, sensata e séria que muitos de nós!
Palavras ditas em 1992! Que são mais do que atuais! São necessárias!

http://youtube.com/watch?v=5g8cmWZOX8Q

sexta-feira, maio 25, 2007

Do juízo...

"Quem não tem Juízo?
O que pergunta ou o que responde?
O que quer dar um pouco do que é seu
Ou o que tinha juízo e que perdeu
E que nem sabe onde?"

Clio - Orfeu da Conceição

E no Rio de Janeiro...







... eu por aqui,
em eternos sarais de meus ais e exclamações dessas novas cores que me coram a face
a cada passo dançado dessa bossa carioca!
Sopra pelas janelas de mim o calor dessa menina, mais mulher,
observadora e encantadora dos novos seres que amadurecem nesta prece de ser inteira, íntegra, trágica e bela!
Nesta intensa atividade de velar a lua e o sol para saber acolher o brilho que deles reflete em mim.
E não saber nada...
Deixar me ao léu,
ao azul do céu do arpoardor,
devanear em meus desejos e observar
chegar o amor por este lugar!
O romantismo me seduz,
a poesia de Vinícius me desarma com sua língua ardente,
e o samba de uma tal cuíca que toca no meu terreiro
sabe bem o tom do meu desatino...
Ah Rio! Tu es divino!

Prece


"Tende infinita piedade delas, Senhor, que são puras
Que são crianças e são trágicas e são belas
Que caminham ao sopro dos ventos e que pecam
E que têm a única emoção da vida nelas."

Do poetinha...


Foto de Manu Melo Franco

Uma viola de amor

Uma viola-de-amor

Dêem ao homem uma viola-de-amor e façam-no cantar um canto assim...

"Sairei de mim mesmo e irei ao encontro das flores humildes dos caminhos e das lentas aves dos crepúsculos, cujo pipilo suspende na paisagem uma lágrima que nunca se derrama.
Sairei de mim mesmo em busca de mim mesmo, em busca de minha imagem perdida nos abismos do desespero, minha imagem de cuja face já não me lembro mais..."

"Sairei de mim mesmo em busca das melodias esquecidas na memória, em busca dos instantes de total abandono e beleza, em busca dos milagres ainda não acontecidos..."

"Que eu seja novamente aquele que ergue do chão o pássaro ferido e, no calor de sua mão, dá-lhe de morrer em paz; aquele que, em sua eterna peregrinação em busca da vida, ajuda o camponês a consertar a roda do seu carro..."

"Que me seja dado, em minhas andanças, restituir a cada ser humano o consolo de chorar dias de lágrimas; e depois levá-lo lá onde existe a luz e chorar eu próprio ante a beleza do seu pranto ao sol..."

"Possa eu mirar novamente os pélagos e compreendê-los; atravessar os desertos e amá-los. Possa eu deitar-me à noite na areia das praias e manter com as estrelas em delírio o colóquio da eternidade. Possa eu voltar a ser aquele que não teme ficar só consigo mesmo, numa dura solidão sem deliqüescência..."

"Bem haja o meu irmão no meu caminho, com as suas úlceras à mostra, que a ele eu hei de curar e dar abrigo no meu peito, Bem haja no meu caminho a dor do meu semelhante, que a ela estarei desvelado e atento..."

"Seja a mulher a mãe, a esposa, a amante, a filha, a bem-amada do meu coração; possa eu amá-la e respeitá-la, dar-lhe filhos e silêncios. Possa eu coroá-la de folhas da primavera em seu nascimento, seu conúbio e sua morte. Tenha eu no meu pensamento a idéia constante de querê-la e lhe prestar serviço..."

"Que o meu rosto reflita nos espelhos um olhar doce e tranquilo, mesmo no mais fundo sofrimento; e que eu não me esqueça nunca que devo estar constantemente em guarda de mim mesmo, para que sejam humanos e dignos o meu orgulho e a minha humildade, e para eu cresça sempre no sentido de Tempo..."

"Pois o meu coração está antes de tudo com os que têm menos do que eu, e com os que, tendo mais do que eu, nada têm. Pois o meu coração está com a ovelha e não com o lobo; com o condenado e não com o carrasco…"

"E que este seja o meu canto e o escutem os surdos de carinho e de piedade; e que ele vibre com um sino nos ouvidos dos falsos apóstolos dos falsos apóstatas; pois eu sou o homem, ser de poesia, portador do segredo e sua incomunicabilidade – e o meu largo canto vibra acima dos ócios e ressentimentos, das intrigas e vinganças, nos espaços infinitos...".

Dêem ao homem uma viola-de-amor e façam-no cantar um canto assim, que sua voz está rouca de tanto insulto inútil e seu coração triste, de tanta vã mentira que lhe ensinaram.

(Vinícius de Moraes)

AMOOOOOOOOOO! Obrigada poetinha!

quarta-feira, maio 23, 2007

Pra plantar

Grão de Amor

Me deixe sim
Mas só se for
Pra ir ali
E pra voltar.

Me deixe sim
Meu grão de amor
Mas nunca deixe
De me amar

Agora as noites são tão longas
No escuro eu penso em te encontrar
Me deixe só
Até a hora de voltar

Me esqueça sim
Pra não sofrer
Pra não chorar
Pra não sentir

Me esqueça sim
Que eu quero ver
Você tentar
Sem conseguir

A cama agora está tão fria
Ainda sinto o seu calor
Me esqueça sim
Mas nunca esqueça o meu amor

É só você que vem
No meu cantar meu bem
É só pensar que vem
Lá ra ra ra

Me cobre mil telefonemas
Depois me cubra de paixão
Me pegue bem
Misture alma e coração

(Arnaldo Antunes)

segunda-feira, maio 21, 2007

Super Mulher


"SUPER MULHER

Por Ana Kessler


São 7h.

O despertador canta de galo e eu não tenho forças nem para atirá-locontra a parede.

Estou TÃO acabada, não queria ter que trabalhar hoje.

Quero ficar em casa, cozinhando, ouvindo música, cantarolando, até.

Se tivesse filhos, gastaria a manhã brincando com eles, se tivesse cachorro, passeando pelas redondezas.

Aquário? Olhando os peixinhos nadarem.

Espaço? Fazendo alongamento.

Leite condensado? Brigadeiro.

Tudo menos sair da cama, engatar uma primeira ecolocar o cérebro pra funcionar.

Gostaria de saber quem foi a mentecapta, a matriz das feministas que teve a infeliz idéia de reivindicar direitos à mulhere por quê ela fez isso conosco, que nascemos depois dela.

Estava tudo tão bom no tempo das nossas avós, elas passavam o dia a bordar, a trocar receitas com as amigas, ensinando-se mutuamente segredos de molhos e temperos, de remédios caseiros, lendo bons livros das bibliotecas dos maridos, decorando a casa, podando árvores, plantando flores, colhendo legumes das hortas, educando crianças, freqüentando saraus... a vida era um grande curso de artesanato, medicina alternativa e culinária.

Aí vem uma fulaninha qualquer que não gostavade sutiã tampouco de espartilho, e contamina várias outras rebeldes inconseqüentes com idéias mirabolantes sobre "vamos conquistar o nosso espaço".

Que espaço, minha filha?

Você já tinha a casa inteira, o bairro todo, o mundo ao seus pés.

Detinha o domínio completo sobre os homens, eles dependiam de você para comer, vestir, e se exibir para os amigos, que raio de direitos requerer?

Agora eles estão aí, todos confusos, não sabem mais que papéis desempenhar na sociedade, fugindo de nós como o diabo da cruz. Essa brincadeira de vocês acabou é nos enchendo de deveres, isso sim.

E nos lançando no calabouço da solteirice aguda.

Antigamente, os casamentos duravam para sempre, tripla jornada era coisado Bernard do vôlei - e olhe lá, porque naquela época não existia Bernard e, se duvidar, nem vôlei.

Por quê, me digam por quê um sexo que tinha tudo do bom e do melhor, que só precisava ser frágil, foi se meter a competir com o macharedo?

Olha o tamanho do bíceps deles, e olha o tamanho do nosso.

Tava na cara que isso não ia dar certo.

Não agüento mais ser obrigada ao ritual diário de fazer escova, maquiar, passar hidratantes, escolher que roupa vestir, que sapatos, acessórios, que perfume combina com o meu humor, nem de ter que sair correndo, ficar engarrafada, correrrisco de ser assaltada, de morrer atropelada, passar o dia ereta na frente do computador, com o telefone no ouvido, resolvendo problemas. Somos fiscalizadas e cobradas por nós mesmas a estar sempre em forma, sem estrias, depiladas, sorridentes, cheirosas, unhas feitas, sem falar no currículo impecável, recheado de mestrados, doutorados, e especializações.

Viramos super mulheres, mas continuamos a ganhar menos do que eles.

Não era muito melhor ter ficado fazendo tricô nacadeira de balanço?


Chega, eu quero alguém que pague as minhas contas, abra aporta para eu passar, puxe a cadeira para eu sentar, me mande flores com cartões cheios de poesia, faça serenatas na minha janela... Ai, meu Deus, 7h30, tenho quelevantar!!!"

Não é bem assim que me sinto; mas tem suas verdades... :)

Manhã...


Eu Sou!


Eu Sou um jardim de flores regado de bênçãos vindas de toda parte!

Obrigada vidaaaaaaa!

Camila Drumond

sexta-feira, maio 18, 2007

É como renascer, todos os dias

" A espantosa realidade das cousas
É a minha descoberta de todos os dias.
Cada cousa é o que é,
E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra,
E quanto isso me basta.
Basta existir para se ser completo. "
Alberto Caeiro

Amar!


Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui...além...Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar!Amar!E não amar ninguém!
Recordar?Esquecer?Indiferente!...Prender ou desprender?É mal?É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei-de ser pó,cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...

Ser poeta

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
E ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não ter sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, e ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!

(Espanca, 2003: 75)

Poetas

Ai as almas dos poetas
Não as entende ninguém;
São almas de violetas
Que são poetas também.

Andam perdidas na vida,
Como as estrelas no ar;
Sentem o vento gemer
Ouvem as rosas chorar!

Só quem embala no peito
Dores amargas e secretas
É que em noites de luar
Pode entender os poetas.

E eu que arrasto amarguras
Que nunca arrastou ninguém
Tenho alma pra sentir
A dos poetas também!

(Espanca, 2002: 23)

Dedo de Deus tocou em mim...


O sol descortina o azul de Ipanema que recebe plena o espetáculo de um dia cheio de graça.
A voz se enreda em canto à sereia Odoiá!
Louvação às ventarolas que ventam sobre o mar! Yansã e Yemanjá!
Borboleta amarela passeia sobre o jardim desta flor em mim, trazendo a presença das entidades do lado de cá!
Chama que vem! Borboleta amarela voa sobre o mar.
Lágrimas brotando da alma que não cabe entre o sim e o não!
Jardim bem cuidado transpira gratidão.
Luz de satisfação interna, terna, que acarinha ao ponto da sensação de que vou explodir!
É sorriso que transforma o rosto, desfaz qualquer tipo de desgosto, desconcerta, desnuda o despreparado, faz sorrir de volta o desarmado.
É imensidão do mar dentro do meu olhar,,,
Um sem fim de paisagens traçadas em pedaços de mim se perdendo em tempo desatinado...
É o tempo perdendo o passo.
O descompasso dos moços jogando bola na areia, equilibrando a atenção entre a fumaça que sai do baseado na mão e os malabares da moça redonda que lhes tira os pés do chão.
Uma bola e a vontade de caminhar pra descobrir, por aí, o que há.
Passeio de apreciar! Eu e Samita, menina que desnuda sensual a mulher que traz em si.
Olhares e sorrisos se abrem brilhantes pelas areias onde passamos.
Não há dúvida de que a beleza da vida em nós não encanta só esta alma que trago livre assim. É coisa de despertar no outro o desejo de também tocar esta “des”forma de estar.
O calor queima a pele enquanto a água respinga trazendo o frescor do equilíbrio.
Movimento das ondas convidam à aventura de se banhar nesta força.
Exercício de mergulhar em si atravessando cortinas de água.
É fé que vem da raiz de me saber daqui, de pés cravados na leveza que arde em mim.
Massagem de areia nos pés e nas mãos. A quase plenitude de ser o prazer.
A benção da "dona nêga" que chega vestida em azul e cor de rosa, sorrindo a beleza que vê em nossos corpos largados feito crianças brincantes.
Dedos batidos no chão e a expressão: "fica a vontade, fica a vontade!"
É mais além...
Coisa de me deixar assim...
Me sentindo uma mulher sem fim!

Coisa de quem sabe das coisas...


quinta-feira, maio 17, 2007

A tal da mineira ... Bole com ela vai!


"Eu sou a tal mineira
Não sou de brincadeira
Sambo pelos sete cantos
Não temo quebrantos pq sou GUERREIRA
Dentro do samba nasci, me criei, me converti e ninguém vai tombar a minha bandeira
Bole com samba que eu caio e balanço o balaio no som dos tantãs
Rebolo, que deito e que rolo
Me embalo e me embolo nos balangandãs
Bambeia de lá que eu bambeio nesse bamboleio q eu sou bam-bam-bam
E o samba não tem cambalacho
Vai de cima embaixo pra quem é seu fã
Eu sambo pela noite inteira até amanhã de manhã
Sou a mineira guerreira filha de xangô com Iansã!!!"
autor desconhecido

terça-feira, maio 15, 2007

Com a palavra...

... Lispector

"Aliás - descubro eu agora - eu também não faço a menor falta, e até o que escrevo um outro escreveria." A hora da estrela

"Onde aprender a odiar para não morrer de amor?" Laços de família

"Não é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso, entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus." Um sopro de vida

"É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo." Perto do coração selvagem

"Talvez a pergunta vazia fosse apenas para que um dia alguém não viesse a dizer que ela nem ao menos havia perguntado. Por falta de quem lhe respondesse ela mesma parecia se ter respondido: é assim porque é assim." A hora da estrela

"E de tal modo haviam se disposto as coisas que o amor doloroso lhe pareceu felicidade." Laços de família

"Quem não é um acaso na vida?" A hora da estrela

"Isto não é um lamento. É um grito de ave de rapina, irisada e intranqüila." Um sopro de vida

"Com Deus a gente também pode abrir caminho pela violência. Ele mesmo quando precisa mais especialmente de um de nós, Ele nos escolhe e nos violenta." A paixão segundo G.H.

"Só quem guarda as armas a chave é quem receia atirar sobre todos."Perto do coração selvagem
"Nem todos chegam a fracassar porque é tão trabalhoso, é preciso antes subir penosamente até enfim atingir a altura de poder cair."A paixão segundo G.H.

"Sua sensibilidade incomodava sem ser dolorosa, como uma unha quebradiça." Laços de família

"Abandone-se, tente tudo suavemente, não se esforce por conseguir - esqueça completamente o que aconteceu e tudo voltará com naturalidade." Laços de família

"O cacto é cheio de raiva com os dedos todos retorcidos e é impossível acarinhá-lo. Ele te odeia em cada espinho espetado porque dói-lhe no corpo esse mesmo espinho cuja primeira espetada foi na sua própria grossa carne. Mas pode-se cortá-lo em pedaços e chupar-lhe a áspera seiva: leite de mãe severa." Um sopro de vida

"Quem sabe a que escuridão de amor pode chegar o carinho." Laços de família

"Não se pode dar uma prova de existência do que é mais verdadeiro, o jeito é acreditar. Acreditar chorando." A hora da estrela

"Oh Deus, eu que faço concorrência a mim mesma. Me detesto. Felizmente os outros gostam de mim. É uma tranqüilidade." Um sopro de vida

"Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas continuarei a escrever."A hora da estrela
"A eternidade é o estado das coisas neste momento." A hora da estrela

"Escrevo por ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens." A hora da estrela

"Eu nunca fui livre na minha vida inteira. Por que dentro eu sempre me persegui. Eu me tornei intolerável para mim mesma." Um sopro de vida

"Ser um ser permissível a si mesmo é a glória de existir." Um sopro de vida

"Perder-se significa ir achando e nem saber o que fazer do que se for achando." A paixão segundo G.H.

"Tudo o que poderia existir, já existe. Nada mais pode ser criado senão revelado." Perto do coração selvagem

"Vida e morte foram minhas, e eu fui monstruosa, minha coragem foi a de um sonâmbulo que simplesmente vai." A paixão segundo G.H.

Brincar de pensar



A arte de pensar sem riscos.

Não fossem os caminhos da emoção a que leva o pensamento, pensar já teria sido catalogado como um dos modos de se divertir.

Não se convidam amigos para o jogo por causa da cerimônia que se tem em pensar.

O melhor modo é convidar apenas para uma visita e, como quem não quer nada, pensa-se junto, no disfarçado das palavras.
Isso, enquanto jogo leve.

Pois para pensar fundo – que é o grau máximo do hobby – é preciso estar sozinho.

Porque entregar-se a pensar é uma grande emoção, e só se tem coragem de pensar na frente de outrem quando a confiança é grande a ponto de não haver constrangimento em usar, se necessário, a palavra outrem.

Além do mais exige-se muito de quem nos assiste pensar:

que tenha um coração grande,amor, carinho, e a experiência de também se ter dado ao pensar. Exige-se tanto de quem houve as palavras e os silêncios – como se exigiria para sentir.

Não, não é verdade. Para sentir exige-se mais.
Bom, mas, quanto a pensar como divertimento, a ausência de riscos o põe ao alcance de todos. Algum risco se tem, é claro.

Brinca-se e pode-se sair de coração pesado.

Mas de um modo geral, uma vez tomados os cuidados intuitivos, não tem perigo.

Como hobby, apresenta a vantagem de ser por excelência transportável.

Embora no seio do lar seja ainda melhor, segundo eu.

Em certas horas da tarde, por exemplo, em que a casa cheia de luz mais parece esvaziada pela luz, enquanto a cidade inteira estremece trabalhando e só nós trabalhamos em casa mas ninguém sabe – nessas horas em que a dignidade se refaria se tivéssemos uma oficina de consertos ou uma sala de costuras – nessas horas: pensa-se.

Assim: começa-se do ponto exato em que se estiver, mesmo que não seja de tarde; só de noite é que não aconselho.
Uma vez, por exemplo – no tempo em que mandávamos roupa para lavar fora – eu estava fazendo o rol.

Talvez por hábito de dar título ou por súbita vontade de ter caderno limpo como em escola, escrevi: rol de... e foi nesse instante que a vontade de não ser séria chegou.

Este é o primeiro sinal do animus brincandi, em matéria de pensar – como – hobby.

E escrevi esperta: rol de sentimentos. O que eu queria dizer com isto tive que deixar pra ver depois – outro sinal de se estar no caminho certo é o de não ficar aflita por não entender;

a atitude deve ser: não se perde por esperar, não se perde por não entender.
Então comecei uma listinha de sentimentos dos quase não sei o nome.

Se recebo um presente dado com carinho por pessoa de quem não gosto – como se chama o que sinto?

A saudade que se tem de pessoa de quem agente não gosta mais,essa mágoa e esse rancor – como se chama?

Estar ocupada – e de repente parar por ter sido tomada por uma súbita desocupação desanuviadora e beata, como se uma luz de milagre tivesse entrado na sala: como se chama o que se sentiu?
Mas devo avisar.

Às vezes começa-se a brincar de pensar, e eis que inesperadamente o brinquedo é que começa a brincar conosco.

Não é bom.

É apenas infrutífero.
(Clarice Lispector)

Humano

Se o meu mundo não fosse humano,
também haveria lugar para mim:
eu seria uma mancha difusa de instintos,doçuras e ferocidades,
uma trêmula irradiação de paz e luta:
se o mundo não fosse humano eu me arranjaria sendo um bicho.
Por um instante então desprezo o lado humano da vida
e experimento a silenciosa alma da vida animal.
É bom, é verdadeiro, ela é a semente do que depois se torna humano.

Salve Clarice Lispector ! E sua sabedoria humana! A mais humana!